Mais um ano de Cultura na Educação Pública
Demétrio Sena - Magé
Fomentar (ou animar) a cultura na Educação Pública é um privilégio. Ser um arte-educador - ou animador cultural, como a Secretaria Estadual de Educação Classifica - me oferece há mais de trinta anos a chance de, ao mesmo tempo: exercer os meus dons como poeta, comunicador, amante fervoroso das artes, e ajudar jovens estudantes a conhecer um pouco do mundo vertiginoso e diverso ao seu redor.
Somos, paralelamente, professores diferenciados, que trabalham no campo da conscientização social e da fomentação da cidadania. Em nossas oficinas de letras e artes e nossos eventos culturais nas escolas, podemos atingir livremente os pontos sensíveis de questões sociais que o sistema impede o professor regente de fazer. São tantos gráficos, tantos malabarismos para corresponder às exigências estapafúrdias do poder, que os professores regentes não têm tempo de ir além das formalidades do ensino. São talentosos, amam seu ofício, mas o poder público os transforma em tecnólogos do ensino formal.
Durante muitos anos, os animadores culturais da Secretaria Estadual de Educação, lotados nas escolas da rede pública do Estado do Rio de Janeiro foram artistas e educadores repletos de sonhos e realizações que levavam encantos diários aos alunos. Tinham recursos a contento para oficinas criativas, eventos culturais e de cidadania na escola. Além dos recursos e horizontes, não havia essa polarização política cujo lado direito é perverso, doentio, impeditivo, cheio de superstições e teorias da conspiração contra as artes, a poesia, o encantamento cultural dos filhos e filhas em desenvolvimento escolar.
E a população como um todo era também enriquecida pelos animadores culturais e sua efervescência: fazíamos eventos coletivos de rua; foram muitas ações culturais nos Arcos da Lapa, nas estações de Metrô, nas universidades do Centro do Rio de Janeiro, no Maracanãzinho e muitos outros espaços. E sabem com a participação protagonista de quem? De alunos e alunas cantores, recitadores, poetas, artistas plásticos, dançarinos e outros, incentivados e preparados pelos animadores culturais de suas escolas.
Tudo isso começou no Governo Leonel Brizola/Darcy Ribeiro, criadores dos Cieps, e toda essa filosofia revolucionária no ensino durou enquanto Brizola se manteve governo e teve alguma força até o governo Cabral. Cabral foi preso por corrupção, mas não há como negar a importância que ele deu aos animadores culturais. Em seu governo, gerenciamos programas de leitura com grandes nomes das letras, a exemplo de Ziraldo, e os animadores culturais escritores lançaram seus livros na Bienal do Rio. Foi uma pena descobrirmos mais tarde, que o Governo Cabral praticou corrupção; lavou dinheiro.
A verdade é que ficou provado que dá para ter Educação de qualidade sem corrupção. Brizola e Darcy provaram isso. O próprio Cabral, que desviou muitos recursos e aplicou o mínimo na Educação, conseguiu fomentar tudo aquilo com aquele mínimo. Imaginem se não tivesse desviado recursos; tivesse aplicado realmente na Educação, os valores que declarou! Imaginem como o trabalho já primoroso dos animadores culturais teria bem mais amplo, com os recursos verdadeiros em uso.
Até a nossa remuneração, nunca mais reajustada, já foi razoável. Isso nos dava um ânimo a mais. De lá para cá, os animadores culturais foram invisibilizados: não recebem recursos de nenhuma natureza para projetos. Não têm mais janelas de atuação com alunos. Se fizerem trabalhos nas comunidades, terão que utilizar seus proventos hoje diluídos, e com esforços sobre-humanos diante de alunos que aprendem, com a sociedade atual, que o pensamento crítico é perigoso; as artes são perniciosas; é pecado ser contestador, criativo e observar os acontecimentos por conta própria. Que até ler ivros não especificamente religiosos pode ser pecaminoso e digno de castigo.
Atualmente, os animadores culturais contam com a sorte (como é efetivamente o meu caso) de terem uma direção escolar que os ajude no possível. Que entenda seu trabalho e o defenda contra quem os vê com maus olhos, ironiza sua invisibilidade no sistema e quer transformá-los em ajudantes de suas funções no local de trabalho, o que nenhum profissional de cultura deve aceitar. Sorte a minha e de poucos colegas, que não passamos por isso.
Para 2026, preparo um projeto fotográfico não só para os alunos, mas para toda a comunidade, de ensaios fotográficos dignos de resgate da auto estima. Realizarei nossa Feira Literária com muitos escritores/escritoras convidados, e mais uma vez apoiarei a realização do Festival Mageense da MPB. Manterei a sala de animação cultural com jogos de mesa, exposições de obras dos artistas de nosso município e darei oficinas pontuais de texto e origami.
Tenho certeza, de antemão, que poderei contar com os nossos diretores Luiz Roberto e Thales, a sua equipe (Juliana e Jaciele), os professores (na medida do possível, pois estão sempre abarrotados de trabalho) e os demais colegas dos outros setores da unidade escolar (secretaria, departamento pessoal, biblioteca, manutenção, inspeção de alunos, cozinha, portaria...), porque são todos fundamentais para meu trabalho.