Olho vivo, faro fino | 30 de outubro de 2017 - 19:17
O POLIVALENTE GERALDO PEREIRA
Geraldo Pereira foi um compositor que se debruçava muito bem sobre os dois principais códigos da MPB: a melodia, na qual frequentemente fazia uso da síncope ou síncopa, que é propriedade de inverter os tempos fortes para os tempos fracos; e a letra, na qual perpassava com clareza situações inusitadas de sentimentos universais, aliados a observações do cotidiano carioca, aliás, um recorte que está sendo desenvolvido por um pesquisador holandês e exímio conhecedor de sua obra com seu discurso polissêmico.
Muito já se falou sobre sua vida e de seu trabalho, principalmente em “Um escurinho direitinho”, de Luís Fernando Vieira, Luís Pimentel e Suetônio Valença, assim como nos textos da coleção “A Nova História da Música Popular Brasileira”, duas fontes imprescindíveis para o entendimento deste personagem da MPB, tão multimídia em sua época, tendo se envolvido com teatro, rádio e cinema.
Em teatro montou uma pequena peça, quando ainda morava no Morro de Mangueira, tendo como base sua letra de “Na subida do morro”, posteriormente vendida e gravada por Moreira da Silva em 1952, atuou como cantor em espetáculos teatrais; no rádio, além de intérprete de outros compositores e de suas músicas, o que viria a ser conhecido, mais tarde, como “Cantautor”, também compunha e gravava jingles publicitários; no cinema participou como cantor e ator coadjuvante em três filmes: “Tudo é Verdade” (Orson Welles, 1942), “Berlim na Batucada” (Luiz de Barros, 1944) interpretando o personagem Cabo Laurindo, e por fim, “Rei do Samba” (Luis de Barros, 1952) sobre a vida do compositor Sinhô. Portanto, nestes rápidos exemplos percebemos o quanto era um artista multimídia para a sua época.
Contudo, outros aspectos de sua produção não foram bem explicitados, pelo menos como deveriam, por exemplo, o cronista. Geralmente quando se fala em cronistas da MPB são citados Noel Rosa e Chico Buarque, com muita propriedade, por sinal, e ainda um Wilson Batista (com certa incipiência também), porém, o compositor não é lembrado neste quesito, o qual tem uma relevante contribuição, porém, pouco estudada e reconhecida. Se cotejarmos sua obra com a de outros compositores da época, por exemplo, os emblemáticos Cartola e Nélson Cavaquinho podemos perceber que os temas desenvolvidos por estes dois mangueirenses tinham como mote, quase sempre, valores e sentimentos universais que espelham a dicotomia subjetivismo/universalismo. Em Nelson Cavaquinho temos a ‘solidão’ em “Luz Negra”, a ‘traição’ em “Notícia”, a eterna luta do ‘bem contra o mal’ em “Juízo Final”, a ‘tristeza’ em “Visita Triste” e a ‘saudade’ em “Quando eu me chamar saudade”. Em Cartola reconhecemos o desenvolvimento dos temas universais como a ‘culpa’ em “Não”, os ‘sonhos’ em “O mundo é um moinho”, a ‘fé’ em “Deus te ouça” e o ‘verdadeiro amor’ em “Divina Dama”, uns poucos exemplos destes dois ícones da nossa cultura musical.
Em Geraldo Pereira a veia de cronista urbano se faz mais latente. Vejamos então algumas de suas músicas que abordam e desenvolvem certas facetas nesta seara:
1 - o popular jogo do bicho em “Acertei no milhar” (c/ Wilson Batista, 1940);
2 - o ambiente das gafieiras, a maioria já desaparecida, do centro da cidade em “Sem Compromisso” (c/ Nelson Trigueiro, 1944) e “Chegou a bonitona” (c/ José Batista, 1948);
3 - a expressão das religiões de matrizes africana em “Pisei num despacho” (c/ Elpídio Viana, 1947);
4 - um meta-samba (samba que fala do próprio gênero) em “Que samba bom” (c/ Arnaldo Passos, 1949);
5 – sua incursão na política em “Ministério da Economia” (c/ Arnaldo Passos, 1951), na qual são retratados fatos e dados ligados à criação do referido órgão pelo presidente Getúlio Vargas;
6 – a violência da polícia nas favelas em "Polícia no morro" (c/ Arnaldo Passos, 1952);
7 - a gastronomia do universo do samba em “Cabritada mal sucedida” (c/ Jorge Gebara, 1953);
8 - a geografia urbana carioca e suas favelas, algumas já desaparecidas, em “Escurinho” (1954).
Sendo assim, cabe aos estudiosos do versátil autor reverem a sua contribuição à MPB, mais especificamente ao samba, e repensarem o seu legado, que ultrapassou a barreira dos anos, tendo em vista a sua contribuição em relatar situações que perduram e que deveriam ter sido extintas para o bem de uma sociedade mais justa.
Na verdade, a sua atuação é muito profícua e não se prende a um só tema ou a um só enfoque, e poderia ser mais explorada sob outras óticas, devido a sua importância no cancioneiro popular.
Temos muito que scannear a alma e a verve deste personagem da MPB, esperando que com o tempo venham à tona outros estudos da nossa literatura-musical complementando assim, a passagem do polivalente Geraldo Pereira.
Muito já se falou sobre sua vida e de seu trabalho, principalmente em “Um escurinho direitinho”, de Luís Fernando Vieira, Luís Pimentel e Suetônio Valença, assim como nos textos da coleção “A Nova História da Música Popular Brasileira”, duas fontes imprescindíveis para o entendimento deste personagem da MPB, tão multimídia em sua época, tendo se envolvido com teatro, rádio e cinema.
Em teatro montou uma pequena peça, quando ainda morava no Morro de Mangueira, tendo como base sua letra de “Na subida do morro”, posteriormente vendida e gravada por Moreira da Silva em 1952, atuou como cantor em espetáculos teatrais; no rádio, além de intérprete de outros compositores e de suas músicas, o que viria a ser conhecido, mais tarde, como “Cantautor”, também compunha e gravava jingles publicitários; no cinema participou como cantor e ator coadjuvante em três filmes: “Tudo é Verdade” (Orson Welles, 1942), “Berlim na Batucada” (Luiz de Barros, 1944) interpretando o personagem Cabo Laurindo, e por fim, “Rei do Samba” (Luis de Barros, 1952) sobre a vida do compositor Sinhô. Portanto, nestes rápidos exemplos percebemos o quanto era um artista multimídia para a sua época.
Contudo, outros aspectos de sua produção não foram bem explicitados, pelo menos como deveriam, por exemplo, o cronista. Geralmente quando se fala em cronistas da MPB são citados Noel Rosa e Chico Buarque, com muita propriedade, por sinal, e ainda um Wilson Batista (com certa incipiência também), porém, o compositor não é lembrado neste quesito, o qual tem uma relevante contribuição, porém, pouco estudada e reconhecida. Se cotejarmos sua obra com a de outros compositores da época, por exemplo, os emblemáticos Cartola e Nélson Cavaquinho podemos perceber que os temas desenvolvidos por estes dois mangueirenses tinham como mote, quase sempre, valores e sentimentos universais que espelham a dicotomia subjetivismo/universalismo. Em Nelson Cavaquinho temos a ‘solidão’ em “Luz Negra”, a ‘traição’ em “Notícia”, a eterna luta do ‘bem contra o mal’ em “Juízo Final”, a ‘tristeza’ em “Visita Triste” e a ‘saudade’ em “Quando eu me chamar saudade”. Em Cartola reconhecemos o desenvolvimento dos temas universais como a ‘culpa’ em “Não”, os ‘sonhos’ em “O mundo é um moinho”, a ‘fé’ em “Deus te ouça” e o ‘verdadeiro amor’ em “Divina Dama”, uns poucos exemplos destes dois ícones da nossa cultura musical.
Em Geraldo Pereira a veia de cronista urbano se faz mais latente. Vejamos então algumas de suas músicas que abordam e desenvolvem certas facetas nesta seara:
1 - o popular jogo do bicho em “Acertei no milhar” (c/ Wilson Batista, 1940);
2 - o ambiente das gafieiras, a maioria já desaparecida, do centro da cidade em “Sem Compromisso” (c/ Nelson Trigueiro, 1944) e “Chegou a bonitona” (c/ José Batista, 1948);
3 - a expressão das religiões de matrizes africana em “Pisei num despacho” (c/ Elpídio Viana, 1947);
4 - um meta-samba (samba que fala do próprio gênero) em “Que samba bom” (c/ Arnaldo Passos, 1949);
5 – sua incursão na política em “Ministério da Economia” (c/ Arnaldo Passos, 1951), na qual são retratados fatos e dados ligados à criação do referido órgão pelo presidente Getúlio Vargas;
6 – a violência da polícia nas favelas em "Polícia no morro" (c/ Arnaldo Passos, 1952);
7 - a gastronomia do universo do samba em “Cabritada mal sucedida” (c/ Jorge Gebara, 1953);
8 - a geografia urbana carioca e suas favelas, algumas já desaparecidas, em “Escurinho” (1954).
Sendo assim, cabe aos estudiosos do versátil autor reverem a sua contribuição à MPB, mais especificamente ao samba, e repensarem o seu legado, que ultrapassou a barreira dos anos, tendo em vista a sua contribuição em relatar situações que perduram e que deveriam ter sido extintas para o bem de uma sociedade mais justa.
Na verdade, a sua atuação é muito profícua e não se prende a um só tema ou a um só enfoque, e poderia ser mais explorada sob outras óticas, devido a sua importância no cancioneiro popular.
Temos muito que scannear a alma e a verve deste personagem da MPB, esperando que com o tempo venham à tona outros estudos da nossa literatura-musical complementando assim, a passagem do polivalente Geraldo Pereira.
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