Baixada Prosa & Verso | 01 de fevereiro de 2013 - 15:30

Não Escritores, Fazedores e as Não Periferias

Escritor é quem escreve, diria Forrest Gump em sua pseudo ingenuidade norte-americana. Nem sempre. Eu, por exemplo, escrevo e não sou considerado escritor. Aliás, não sou alegre nem sou triste, sou poeta. E cronista, às vezes.

Jornalistas, blogueiros, compositores, também escrevem e não são ditos escritores. Meu amigo Marcus Lontra certa vez disse que a pós-modernidade arrebentou com as nomenclaturas artísticas. Concordo. Mas ao mesmo tempo existe um establishment que pontua, classifica e elege quem merece receber o título de artista mor em cada área, em cada linguagem. Martinho da Vila, Zeca Pagodinho e Jorge Aragão são taxados como sambistas. De fato, eles atuam como compositores, músicos e intérpretes, tanto quanto Edu Krieger, Chico Buarque e Gil. E estes também fazem samba. Qual a diferença? É a fala de quem tem voz pública. A mídia dominante tenta classificar o inclassificável.

Você, leitor, acha talvez exagero do articulista... Mas imagine a multidão de fazedores de arte nas várias periferias do Rio de Janeiro, como exemplo. São jovens e não tão jovens que fazem filmes – são cineastas? Fazem fotografia – são fotógrafos? Fazem poesia – são poetas?

As chamadas novas tecnologias, a possibilidade de publicação em ambiente virtual, o estabelecimento de redes, tudo isso complicou e complica cada vez mais a ambiência de criação e difusão dos produtos de arte e cultura.

Diz-se que a Baixada Fluminense é um celeiro de artistas e produtores de cultura mais ou menos não reconhecidos. Sei que estes não aceitam ser tratados como carentes. Esta galera não é domesticável. E por que deveria ser? Quer e exige a sua farpela, a sua parcela no bolo e no rolo contemporâneos. Nem adianta vir com papinho de “caravana”, que até os saarianos e os beduínos rejeitam. Não vale vir com historinha de “trazer cultura”. Não. Aqui já há cultura. Aqui já se faz cultura. No sentido amplo, antroplógico, se quiserem. E também no sentido estrito, do específico simbólico, o qual cabe à arte principalmente. Não. Neocolonialismo cultural não. O que se quer é troca. Em patamares justos. Até porque não é a cultura uma via de mão única, nem sequer de mão dupla. É uma via de múltiplas mãos. Uma bricolagem de saberes e fazeres, onde ninguém é bobo. Querem, tais agentes, em primeiro lugar, respeito. E junto, todos os direitos: verbas governamentais, acessos, publicidade, possibilidade de viver de seus trabalhos.

Querem muito? Talvez, para quem enxerga pouco. O mundo está mudando, rápido. Conhecimento começa a valer mais do que sobrenome. Falar de sua aldeia passa a ser falar dos dilemas do mundo. E falar a partir de sua aldeia, falar com o mundo. O centro passou a ser onde o fazedor está. Então, o que será a periferia?

Escritor é quem escreve, artista é quem faz arte, idiota é quem faz idiotice.


Recado Dado

Bem-vinda Marta Suplicy, Ministra da Cultura. Esperamos olhar abrangente e eficiência nas ações. As periferias, que não o são, clamam por um PAC da Cultura, pelo reconhecimento dos artistas populares, pelo apoio ao novo e ao experimental, pelo fortalecimento dos Pontos, das vírgulas e de todos os nossos sinais. Verba, inclusão e justiça. Cultura de todos, Cultura para todos. Tarefa árdua, Marta. Conte com nosso apoio, nossa crítica e nossos fazeres.


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Sobre o autor

Jorge Cardozo é Poeta e Gestor de Projetos Culturais e um dos protagonistas da movimentação cultural na Baixada Fluminense. Enquanto prepara seu novo livro de poemas, Ave da Periferia, Cardozo participa de saraus e discute a produção artístico cultural da região. O poeta chegou para falar.

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