Ao fim, ao cabo! | 19 de dezembro de 2010 - 19:30

Blitz que não é Kreig

Já algum tempo essa palavra vem me dando calafrios. Não que eu tenha
sofrido a Luftwaffe alemã e seu intensivo bombardeio sobre o Reino
Unido, nem que eu seja um traficante-contrabandista querendo furar uma
barreira, mas acredito que a sensação sentida é a mesma de um inglês
da Segunda Guerra ou um “avião” carioca: Blitz é um problema.
Primeiro por que causa um imenso engarrafamento, num horário e num
local que, a priore, não deveria estar congestionado. Se você sacar
que o transito parou derrepentemente, do nada, pode apostar ou é um
acidente ou é uma Blitz.
Alguém aí já viu uma Blitz na hora do Rush? Em dia de chuva? Sendo
sempre um transgressor dessas barreiras relâmpagos descobri que as
Blitz oficiais (as que apreendem mesmo) terminam às 17h. Fora desse
horário, pelo menos no Rio de Janeiro, é só “arrego”. Arrego caro
leitor rima com corrupção. Atire a primeira pedra quem nunca subornou
um PM, com eufemismo: é só um “cafezim pro” agente senhor seu guarda,
afinal coitado, ele ganha tão mal mesmo! Imagine os professores
entrando nessa onda?
Se eu fosse um trabalhador do tráfico eu só transportaria o
contrabando no horário do almoço, dificilmente tem Blitz nesse
horário, meio dia os “homi” estão filando a comida de algum
restaurante “amigo”. Entendam que isso não é uma dica para
contraventores é apenas uma sociologia barata de quem sempre teve
problema com as Blitz. A combinação de dia chuvoso, com horário de
pico é também muito interessante para encontrar pouco ou quase nenhum
PM em ação na cidade.
Do alemão Blitz significa “raio” ou “relampago” foi um termo cunhado
pelos ingleses que sofreram com a tática do Blitzkrieg “guerra rápida”
alemã. Tomado de contrabando (com trocadilho por favor) pela língua
“nostra” ganhou uma derivação por extensão de sentido, Blitz
significa batida policial inesperada e nossa história de fuga começa
em 2007, ano que eu comprei uma moto. Pensando bem, minha primeira
experiência empírica com as Blitz, remonta o ano de 2003. Eu ainda
bobo, digo novo, tinha carteira de motorista, mas não tinha carro, meu
pai me emprestou seu monza tubarão prata, todo “filmado” com documento
atrasado que não passaria batido nem em barreira de quermesse. Eu
tinha 20 anos, tinha ido para um churrasco em Jacarepaguá, na volta,
já bastante bêbado, peguei a Linha Amarela e desci na Av. Brasil,
sentido Baixada, quando em frente ao CPOR em Bonsucesso uma mega Blitz
me parou. Só muito novo, ou bobo, para não saber que ali sempre tem
Blitz. Eu tinha três reais no bolso e estava com meu irmão de 7 anos
no carona, já decidido desci dizendo que o documento tava atrasado,
que estava com meu filho doente no carro e fui abrindo a carteira
perguntando o que eu podia fazer. O Soldado arregalou os olhos e disse
para eu entrar no carro e colocar o dinheiro no documento, entrei e
botei meus míseros 3 reais no documento e ele pegou, nem viu quanto
tinha, tirou discretamente o dinheiro e arremessou no bolso, devolveu
meu documento e me mandou embora.
Aff!!! Ainda bem que tem gente que se vende por 3 reiais. Essa seria a
primeira de uma série, já pensou se fosse Lei Seca? Só não vou relatar
os problemas com Lei Seca por dois motivos: o primeiro é que a Lei
Seca fere teoricamente o sentido conceitual da Blitz, toda barreira de
Lei Seca não é inesperada, o elemento surpresa (essência da Blitz) é
desrespeitado e toda semana, no mesmo dia e na mesma hora ela tá lá no
mesmo lugar. Outra questão é que hoje existe o Twitter da Lei Seca, os
bebuns de plantão se auto-ajudam e não deixam desinformado seus
colegas de copo, armou uma BOLS (assim eles chamam no mini-blog) todo
mundo já sabe.
Depois de 2007 essa foi minha vida fora da lei, com a moto com o
documento ok, eu ia para o trabalho e para a faculdade, só tinha um
problema, eu não era habilitado para moto. Passei o ano de 2007 no
“arrego”, dez aqui, vintinho ali, cinquinho aculá, até que um dia,
numa quinta-feira eu saí de Magé umas 13hrs e na entrada de Caxias,
por volta das 14hrs (esse horário é péssimo) fiz uma curva acentuada,
aquela que você se sente piloto de moto-velocidade, quando avistei em
cima a danada da Blitz, não teve jeito, só motoqueiro parado, todo
mundo com cara de triste, pensei: já era. O policial me abordou
educadamente, viu que eu tava sem habilitação, mandou eu esperar,
esperei um pouco, fui até ele e perguntei se não tinha negociação eu
poderia ligar para alguém habilitado para buscar a moto e dar uma
molhada na mão dele, ele disse que por ele tudo bem mais a operação
era comandada pelo Tenente Fulano que tinha uma meta de tantas
apreensões a bater, tava tendo muito assalto de homens em motocicleta
e que não daria para aliviar: a moto seria conduzida para o depósito
público.
Era um policial de boné branco, a partir daí eu aprendi que policial
de boné branco é APETRAN, polícia de trânsito, com essa galera não tem
arrego. Até tem, pois uma vez em Benfica dei 70 pratas para a APETRAN
mas foi por que disse que era professor e tava na batalha, o sujeito
foi com minha cara, olhou minha mochila cheias de provas por corrigir
e limpou minha carteira, eu tinha oitenta, pedi para deixar dez pois a
gasolina estava no “cheiro” e ele foi bacana. Nunca mais passei por
essa Blitz que sempre tem na entrada de Benfica pois é só cortar pela
rua do presídio que tem ali e fica tudo certo, mas andar irregular por
Benfica é perigoso, lá fica o pátio das apreensões e volta e meia tem
Blitz sem “arrego” por lá.
Depois disso consegui comprar um carro, durante uns meses andei na lei
e não fui parado, parece que o policial sabe quando tá tudo certo,
desconfio que durante a formação eles têm uma disciplina que os
qualifica para saber se o motorista tem alguma irregularidade ou não.
Fiquei enrolado financeiramente e não consegui fazer a vistoria anual,
várias Blitz me pararam e relatarei apenas uma que me marcou.
Eu tava saindo da Tijuca e indo para o Riachuelo, resolvi pegar o
caminho por Benfica foi quando passei em frente a UERJ e pensei: deve
ter Blitz, melhor estacionar e ir de trem. Mesmo intuindo isso
repensei: vou arriscar!! Não deu outra quando sai na Radial Oeste e
virei na direita embaixo do viaduto da Mangueira lá estava ela, o
coração palpitou e fui parado. O policial olhou a documentação e falou
que o veículo seria apreendido. Conversa vai, conversa vem me pediu
150 pratas, eu falei que só tinha 50, ele foi irredutível, ou 150 ou a
apreensão, a escolha era minha. Ele até fez a conta de quanto eu
gastaria com a apreensão, papo de 400 reais. Falei que tinha a grana
no banco ele ficou com meu documento do veículo e falou para ir de
carro, indaguei que poderia ser parado por outra blitz ele disse que
era só falar que eu já tinha sido parado pela operação do Sargento
Beltrano e que tava resolvendo o “arrego”. Foi isso, fui ao banco,
tirei o dinheiro voltei pelo mesmo caminho paguei o “pedágio” peguei
meu documento de volta. Novamente perdi um dinheirão e prometi a mim
mesmo que por essa situação não passaria mais. Hoje ando na completa
legalidade, meu carro é preto com vidros escuros, sou um tremendo
chama Blitz e não fico além de meia hora nelas, pois os policiais
vendo a documentação em dia ficam procurando drogas, outro dia na
descida do viaduto de Benfica, perto da Record, um policial
perguntou-me se havia drogas no carro, eu respondi que não e lhe
informei que na Mangueira devia ter muita era só ele ir lá. Ele calou
a boca, revistou o carro e me liberou, fulo por não ter arrumado o
“cafezim” do dia.


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Sobre o autor

Professor de História, documentarista, poeta e pesquisador da relação Cinema-História.

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